Em artigo publicado no dia 4 de agosto, o banco de investimento brasileiro BTG Pactual abordou o mercado de transferências no futebol, ressaltando as características dessa indústria multibilionária, apontando algumas de suas dinâmicas mais recentes e apresentando uma visão geral do setor na Europa e no Brasil. Além disso, o estudo destaca o papel fundamental do Brasil nessa indústria de ritmo acelerado, que gera negócios multibilionários com transferências de jogadores.
Em abril desse ano, o BTG Pactual iniciou uma série de reportagens sobre a indústria do futebol, discutindo a dinâmica deste setor em mercados mais desenvolvidos, como a Europa, e comparando com a realidade brasileira, além de identificar as principais oportunidades e desafios para os próximos anos. Em suas três publicações anteriores, foram abordados temas como a criação de uma liga no Brasil, as especificidades dos clubes-empresas, as principais linhas de receita de um clube de futebol e como as receitas de transmissão são negociadas e distribuídas no Brasil.
Dando continuidade à série, o BTG publicou o seu quarto estudo, se aprofundando em outro fluxo de receita importantíssimo para os clubes: transferências internacionais de jogadores. Mesmo diante dos impactos sofridos por esse mercado durante a pandemia de Covid-19 em 2020/21, as transferências de jogadores foram vitais para a geração de receita dos clubes de futebol, principalmente no Brasil, representando 27% da receita dos clubes da Série A do Campeonato Brasileiro em 2020 – superando até mesmo a Premier League, com 20%.
Visão geral da indústria de transferências
De acordo com a FIFA, 18.068 transferências internacionais foram concluídas no futebol profissional masculino em 2021 – abaixo apenas da temporada de 2019, que registrou um recorde de 18.080. Essas transferências geraram um total de US$ 4,9 bilhões e foram feitas por 4,5 mil clubes, que negociaram 15.617 jogadores de 179 nacionalidades. Alguns jogadores podem ser transferidos mais de uma vez na mesma temporada, como jogadores transferidos por empréstimo e que retornam no mesmo ano.
Temporada | Transferências internacionais |
2012 | 12.006 |
2013 | 12.734 |
2014 | 13.159 |
2015 | 13.607 |
2016 | 14.635 |
2017 | 15.662 |
2018 | 16.550 |
2019 | 18.080 |
2020 | 17.180 |
2021 | 18.068 |
Embora as transferências possam ser feitas em qualquer mês, a janela de transferência internacional mais tradicional é entre os meses de julho e agosto (janela de transferências do verão), período em que é realizada a pré-temporada da maioria das ligas europeias. Em 2021, por exemplo, 43% das transferências foram feitas neste período.
Distribuição mundial de clubes profissionais que contrataram e/ou venderam jogadores em 2021:
* O tamanho da bolha representa transferências concluídas
Taxas de transferência
Para concluir uma negociação, em alguns casos, é necessário que seja paga uma taxa de transferência, que é basicamente uma compensação monetária negociada entre os clubes durante a transação, que pode incluir taxas fixas, taxas condicionais e taxas de compra. Outras taxas também podem ser incluídas em uma transferência, como taxas de venda e de contribuição solidária, mas essas não foram contabilizadas no relatório da BTG Pactual, que se baseou na mesma forma que a FIFA analisa as transações.
Geralmente, as transações que envolvem taxas de transferência atraem mais atenção da mídia e do público, uma vez que costumam envolver jogadores e clubes mais famosos, além das maiores quantias de dinheiro. Porém, as taxas de transferência são incluídas apenas em uma pequena parcela do total de transferências. Em 2021, somente 12% das transferências incluíram uma taxa de transferência no negócio (totalizando US$ 4,9 bilhões).
Confira abaixo as 20 melhores transferências da temporada 2021/22 na Europa, em termos de honorários. No total, as taxas de transferência acumuladas deste top 20 superam € 1,0 bilhão.
Jogador | Clube de origem | Clube de destino | Taxa de transferência (em euros) |
Jack Grealish | Aston Villa | Manchester City | € 118 milhões |
Romelu Lukaku | Inter de Milão | Chelsea | € 113 milhões |
Jadon Sancho | Borussia Dortmund | Manchester United | € 85 milhões |
Dusan Vlahovic | Fiorentina | Juventus | € 82 milhões |
Achraf Hakimi | Inter de Milão | PSG | € 67 milhões |
Ben White | Brighton & Hove Albion | Arsenal | € 59 milhões |
Ferran Torres | Manchester City | Barcelona | € 55 milhões |
Luis Diaz | Porto | Liverpool | € 47 milhões |
Dayot Upamecano | RB Leipzig | Bayern de Munique | € 43 milhões |
Bruno Guimarães | Lyon | Newcastle | € 42 milhões |
Raphael Varane | Real Madrid | Manchester United | € 40 milhões |
Tammy Abraham | Chelsea | Roma | € 40 milhões |
Ibrahima Konaté | RB Leipzig | Liverpool | € 40 milhões |
Emiliano Buendia | Norwich City | Aston Villa | € 38 milhões |
Martin Odegaard | Real Madrid | Arsenal | € 35 milhões |
Rodrigo de Paul | Udinese | Atlético de Madrid | € 35 milhões |
Kurt Zouma | Chelsea | West Ham | € 35 milhões |
Leon Bailey | Bayern Leverkusen | Aston Villa | € 32 milhões |
Eduardo Camavinga | Stade Rennais | Real Madrid | € 31 milhões |
Patson Daka | RB Salzburg | Leicester City | € 30 milhões |
As diferenças entre as confederações continentais
Em geral, as confederações continentais, UEFA (Europa), CONMEBOL (América do Sul), CONCACAF (Norte e Central América e Caribe), CAF (África) e AFC (Ásia), têm um equilíbrio no número de jogadores transferidos, tanto de venda quanto de compra. No entanto, esse equilíbrio não é observado ao analisar os valores das taxas de transferência pagas e recebidas por cada confederação, especialmente em confederações não europeias.
Ao analisar o volume total de taxas de transferência da CONMEBOL, por exemplo, constata-se que 88% estavam relacionadas às taxas de transferência recebidas, enquanto apenas 12% representavam valores pagos pela confederação. Veja abaixo dois gráficos publicados no estudo do BTG Pactual, que demonstram os volumes de transferências de saída e entrada e a disparidade dos valores de receitas e pagamentos de taxas de transferências entre as confederações.
Transferências de saída vs. de entrada (nº de jogadores)
*Em azul escuro, as transferências de saída. Em azul claro, de entrada.
Taxas de transferência recebidas e pagas (US$ milhões)
* Em azul escuro, as taxas de transferência recebidas. Em azul claro, as taxas pagas.
Essa assimetria reflete em parte a direção do fluxo de jogadores entre as confederações e a diferença de poder aquisitivo entre clubes sul-americanos e europeus. Um fator chave é que é mais comum que jovens jogadores sul-americanos sejam transferidos para ligas europeias do que o contrário. Além disso, geralmente são cobradas taxas mais altas em transferências domésticas do que em transferências internacionais, justamente para evitar a transferência de jogadores para clubes locais rivais. Como as receitas dos clubes sul-americanos são contabilizadas em moedas desvalorizadas em comparação às utilizadas por clubes europeus, a disparidade do poder de compra acentua essa assimetria.
A importância do Brasil no mercado de transferências mundial
Um dos principais países do mercado de transferências global, o Brasil representou 10% das transferências de jogadores em 2021, com base na nacionalidade dos jogadores negociados. Os valores recebidos por meio de taxas de transferência representaram 27% da receita dos clubes da Série A do Campeonato Brasileiro em 2020 – superando até mesmo a Premier League, com 20%. De acordo com o Sports Value, os 10 melhores clubes brasileiros em transferência de jogadores arrecadaram um total de R$ 18,5 bilhões entre 2003 e 2020.
10 clubes brasileiros que mais geraram receita com transferências de jogadores entre 2003 e 2020:
Clube | Receita gerada (em reais) | |
1. | São Paulo | R$ 2,977 milhões |
2. | Internacional | R$ 2,784 milhões |
3. | Corinthians | R$ 2,200 milhões |
4. | Santos | R$ 1,896 milhões |
5. | Cruzeiro | R$ 1,804 milhões |
6. | Athletico-PR | R$ 1,534 milhões |
7. | Palmeiras | R$ 1,475 milhões |
8. | Flamengo | R$ 1,312 milhões |
9. | Grêmio | R$ 1,279 milhões |
10. | Atlético-MG | R$ 1,262 milhões |
O Brasil ocupa o primeiro lugar em termos de nacionalidade dos jogadores transferidos (10% de todas as transferências internacionais), com quase duas vezes mais transferências do que a Argentina, que está em segundo lugar. Porém, apesar de ser historicamente a principal nacionalidade em termos de taxas de transferência totais recebidas, o Brasil perdeu o primeiro lugar para França em 2021.
Ranking da nacionalidade dos jogadores transferidos em 2021:
- Brasil – 1.749 jogadores
- Argentina – 896 jogadores
- Reino Unido – 837 jogadores
- França – 772 jogadores
- Colômbia – 653 jogadores
- Nigéria – 624 jogadores
- Espanha – 537 jogadores
- Gana – 456 jogadores
- Sérvia – 446 jogadores
- Holanda – 408 jogadores
Fonte: FIFA, BTG Pactual
Ranking das taxas de transferência recebidas por nacionalidade dos jogadores em 2021:
- França – US$ 643,6 milhões
- Brasil – US$ 468,4 milhões
- Espanha – US$ 307,2 milhões
- Argentina – US$ 292,6 milhões
- Reino Unido – US$ 286,5 milhões
- Holanda – US$ 258,7 milhões
- Bélgica – US$ 245,9 milhões
- Portugal – US$ 188,6 milhões
- Croácia – US$ 146,3 milhões
- Dinamarca – US$ 136,9 milhões
Fonte: FIFA, BTG Pactual
Tendências de crescimento no mercado de transferências
Em sua conclusão, o relatório do BTG Pactual ressalta que o mercado de transferências continuou apresentando números impressionantes mesmo com os impactos da Covid-19, provando que é não só uma indústria grande e estabelecida, mas também um negócio com potencial de crescer ainda mais. Entre a criação de uma liga de futebol no Brasil e o investimento no futebol feminino, o estudo aponta algumas maneiras para aumentar as receitas disponíveis para os clubes, o que pode, por consequência, impulsionar a indústria de transferências.
Baseado no caso da La Liga, que aumentou substancialmente os investimentos em transferências de jogadores, de 10% (2013-16) para 36% (2016-19), após implementar a negociação centralizada de direitos audiovisuais, o relatório aponta que a criação de uma liga no Brasil pode impulsionar as receitas de transferências. Ao melhorar a distribuição de receita entre os clubes e, consequentemente, aumentar as suas receitas, uma nova liga pode permitir que os clubes façam mais transferências e melhorem seu desempenho em campo, criando um ciclo virtuoso.
Em crescimento constante, a indústria do futebol profissional feminino foi responsável por 1,3 mil transferências internacionais, em 2021. Jogadoras de 113 países, 414 clubes e 112 associações ajudaram a alcançar esse número impressionante no ano passado. Ao contrário da indústria de transferências masculinas, as taxas de transferência aumentaram consistentemente desde 2018, atingindo um recorde de US$ 2,1 milhões em 2021 (+73% a/a), mostrando o crescimento do mercado de transferências no futebol feminino.