Há exatos 20 anos, as quadras de Wimbledon coroaram um novo rei no tênis. Roger Federer, ainda com cabelo comprido, conquistaria o 1º de seus 20 Grand Slams da carreira. Ainda não sabíamos, mas marcaria o início de uma nova era no esporte. Mas vamos dar alguns passo atrás.
Alguns anos antes, o tênis virou moda no Brasil, com a conquista de Roland Garros por um jovem Gustavo Kuerten. Guga virou celebridade instantânea no Brasil; seu carisma, o sorriso, os cabelos compridos e a simpatia, somadas ao jogo completo do atleta fizeram com que o esporte rompesse a bolha no país. A carreira, repleta de títulos e momentos marcantes, foi abreviada por um sem número de lesões, ao ponto que em 2004, ele já não constava mais no top-50 da ATP, ranking que chegou a liderar em 2000. Seu legado para o esporte (em especial no Brasil) foi tremendo. O número de praticantes e interessados pelo esporte cresceu muito, competições ganharam mais espaço na grade horária das TVs.
A saída de cena de Guga esfriou um pouco o interesse geral do público pelo tênis. Os que ficaram, no entanto, pegaram a maior onda do esporte. Porque, como comentamos acima, foi em 2003, na grama sagrada de Wimbledon, que a maior geração de tenistas dos nossos tempos se apresentou ao mundo. Federer já havia conquistado títulos menores, mas foi a partir de sua primeira conquista de Grand Slam que todos pararam pra prestar atenção em detalhes. Em uma janela de 3 anos, o suíço abocanhou inacreditáveis 31 títulos, incluindo 8 Grand Slams. E fez o mundo do esporte se perguntar: “estamos diante do possível maior de todos os tempos?”. Federer nunca parou de conquistar títulos – foram mais de 100 ao longo de 24 anos – até sua aposentadoria, em 2022. Mas ele teve seus obstáculos no caminho – gente que, assim como ele, mudou o esporte.
O primeiro – e mais famoso deles – foi Rafael Nadal. O espanhol, quase 5 anos mais jovem, apareceu ao mundo com a conquista de Roland Garros, em 2005. E foi no saibro que se estabeleceu como uma lenda, vencendo um recorde absoluto de 14 edições do torneio – o tênis masculino nunca viu domínio de um atleta sobre uma competição como essa. Nadal foi o primeiro grande rival de Federer, contra quem tem um recorde positivo. O “Rei do Saibro” se estabeleceu como uma das grandes figuras do esporte e caminhou, lado a lado, com Federer, nas discussões sobre melhor de todos os tempos. E, assim como o suíço, poderia ter ido ainda mais longe.
O maior obstáculo de Nadal veio da Sérvia: um ano mais novo, Novak Djokovic se meteu no meio dos rivais pelo posto de melhor tenista do mundo no fim dos anos 2000 – e dominou a maior parte da década seguinte, com a conquista de 16 Grand Slams no período. Recentemente, Djokovic assumiu a liderança histórica de conquistas de Grand Slams – com um total de 23, contra 22 de Rafa e 20 de Federer, os líderes da disputa. Nole, como é chamado, teve recorde positivo contra os dois rivais e é, nesse momento, o único que ainda não anunciou aposentadoria do tênis – Rafa recentemente declarou que está entrando em seu “tour de despedida”.
As últimas duas décadas também tiveram outras figuras importantes, com destaque para o britânico Andy Murray, que não apenas chegou a 12 finais de Grand Slams (com 3 conquistas), como foi uma voz muito ativa na luta pela equidade entre homens e mulheres no circuito, o que ajudou a romper a bolha do esporte. Foi o primeiro dos 4 a se aposentar, após longa batalha contra o próprio corpo.
Com o fim de uma geração, sempre se suscita a dúvida: “e agora?”. Os esportes têm a capacidade de sempre se renovar: eles estabelecem suas próprias histórias, seus ícones e referências para as próximas gerações do tênis mundial. E isso ficou em evidência na final de Wimbledon deste ano, semana passada: Djokovic foi derrotado pelo jovem fenômeno Carlos Alcaraz, de 20 anos, e atual número 1 do mundo no ranking da ATP. Ao fim da partida, Djokovic declarou que “ele tem um pouco de Roger, Rafa e mim nele”. Um elogio e tanto. E concluiu com “a nova geração está chegando, o esporte está em boas mãos”. Mas na mão de quem?
Carlos Alcaraz
O vencedor de Wimbledon 2023 iniciou sua carreira profissional em 2020, numa participação no Rio Open, ainda adolescente. Ele conquistou seu primeiro título no fim de 2021 e, desde então, já levantou 12 títulos, incluindo 2 Grand Slams. OS números, por si só, são impressionantes, mas chama atenção que ele tenha conquistado tal façanha com menos idade do que os ícones que dominaram os últimos 20 anos do esporte. Ele ainda superou os ídolos na corrida de “jogador a alcançar 100 vitórias mais rápido”, em 132 jogos, ficando atrás apenas da lenda americana John McEnroe.
Chamado de “fenômeno” no circuito, Alcaraz já tem uma longa lista de patrocinadores, entre Nike, Calvin Klein, Rolex, BMW e Louis Vuitton, que somados aos prêmios do circuitos, já lhe renderam mais de 20 milhões de euros.
Treinado pelo ex-número 1 do mundo, o também espanhol Juan Carlos Ferrero, Alcaraz tem um estilo de jogo “all around”. Ele tem notas de defesa de Rafael Nadal, agilidade, consistência e força mental de Djokovic, e o poder de fogo de Roger Federer. E, o mais impressionante, faz tudo isso se adaptando a qualquer estilo de piso. No seu breve currículo, já constam também vitórias sobre Nadal e Djokovic.
Casper Ruud
Outro nome da nova geração, um pouco mais velho que o espanhol, é o atual número 4 do mundo, o norueguês Casper Ruud. Até o momento, o atleta não conquistou nenhum torneio de Grand Slam, mas já chegou a 3 finais desde 2022 – um indicativo de que está em sua melhor forma. Nesse ano, perdeu a decisão de Roland Garros para Carlos Alcaraz. É difícil projetar se ele terá um sucesso fora da curva ou não, mas salvo qualquer imprevisto, devemos ver ele conquistar um título de primeira prateleira num futuro não muito distante.
Fãs mais hardcore do esporte devem lembrar de seu pai, Christian Ruud, que esteve no circuito com menos destaque nos anos 90. O jovem, inclusive, já superou o pai em rankeamento – é o jogador da Noruega mais bem ranqueado da história da ATP – e em premiações. No total, o jovem já abocanhou mais de 15 milhões de dólares em premiações. Entre seus patrocinadores, estão a Porsche, Samsonite, entre outras.
Seu piso favorito é o saibro, onde conquistou 9 dos seus 10 títulos até o momento, e seu ídolo, Rafael Nadal. Ele inclusive participou da “Academia Rafael Nadal” no início de sua trajetória.
Holger Rune
Um dos caçulas da geração, nascido em 2003, o dinamarquês Holger Rune é o atual número 6 do ranking da ATP e tem como maior conquista, até o momento, o Masters 1000 de Paris, em novembro passado, quando derrotou o favorito Novak Djokovic de virada na final. Apesar do currículo menos parrudo que seus pares, Rune coleciona bons resultados contra tenistas top-10, tendo recorde positivo diante de nomes como Alexander Zverev, Dominic Thiem, Stefanos Tsitsipas, Jannik Sinner e o já citado Djokovic.
Rival de Alcaraz nos torneios de juniores, ele enxerga que sua disputa particular com o espanhol pode ser a nova “Federer x Nadal” dos anos 2020/2030. Aos 20 anos, há tempo e espaço o suficiente para se estabelecerem como dois dos mais importantes nomes do esporte.
Na breve carreira, já acumulou cerca de 6 milhões de dólares em premiações e patrocínios. Na lista de apoiadores do atletas, estão Nike e a fornecedora de raquetes Babolat, mais antiga fabricante do mundo ainda em atividade.
Stefanos Tsitsipas
Atual número 5 do mundo (chegou a figurar como número 3), o grego Stefano Tsitsipas é dos mais velhos da geração. Ativo desde 2017, o atleta já ganhou 9 títulos na carreira e esteve em duas finais de Grand Slams, ambas perdidas para Novak Djokovic, a mais recente no Australian Open desse ano. No seu currículo, consta um título de ATP Finals contra Dominic Thiem, em 2019, e dois Masters 1000 de Monte Carlo. Assim como seus companheiros de geração, é mais um a ser o “mais bem ranqueado” da história de seu país na lista da ATP.
Presença garantida no top-10 há 4 anos, Tsitsipas já acumulou mais de 25 milhões de dólares, entre premiações e patrocínios. Marcas famosas como Adidas, Rolex, Wilson, New Balance e Red Bull estão na sua lista de patrocinadores.
Sua família é repleta de atletas, incluindo a mãe, ex-jogadora profissional de tênis, e o avô, medalhista olímpico de futebol em 1956.
Andrey Rublev
Vindo de uma das escola super tradicional do esporte, o russo Rublev é outro experiente da geração. Estabelecido no circuito desde 2017, ele já conquistou 13 títulos de simples, mas nunca teve vida muito longa em nenhum Grand Slam – sua melhor performance foram as quartas-de-final. Por outro lado, o jogador tem grande sucesso nas competições coletivas: venceu a Copa Davis e ATP Cup em 2021, jogando ao lado de nomes como Daniil Medvedev e Karen Krachanov. Entre suas conquistas, também está um ouro olímpico, conquistado em duplas mistas com Anastasia Pavlyuchenkova, em Tóquio.
O russo já angariou mais de 17 milhões de dólares na carreira. E seguiu um caminho diferente do tradicional: o atleta rompeu longa parceria que tinha com a Nike e criou sua própria marca, a “Rublo”.
Jannik Sinner
O italiano, atual número 8 do mundo, vem de sua melhor performance em um Grand Slam, ao chegar nas semifinais de Wimbledon, onde foi derrotado por Novak Djokovic. Nessa temporada, o italiano já chegou a outras 3 finais, com um título no caminho. Em sua breve carreira, conquistou 7 no total. Seu estilo de jogo centrado e elegante já foi comparado ao de Roger Federer, a quem Sinner tem como ídolo.
Profissional desde 2018, ele já acumulou mais de 8 milhões de dólares, vindos de torneios, da Rolex, Alfa Romeo, Lavazza entre outros.
Durante a pandemia, viralizou com a campanha #SinnerPizzaChallange, onde doava 10 euros para compra de suprimentos médicos a cada foto com figuras que lembrassem ele ou outra figura importante italiana comendo pizza.
Outros nomes da nova geração
Nomes que também tem se destacado e vale ficar de olho para os próximos anos são: o americano Taylor Fritz, de 25 anos; seu compatriota de mesma idade, Frances Tiafoe; e o canadense de 22 anos, Felix Auger-Aliassime.
Conclusão
Ainda que a geração histórica não tenha parado completamente, estamos diante de uma transição real no circuito masculino de tênis. Depois de ver 4 nomes dominarem completamente os torneios mais importantes do tênis por duas décadas, parece que estamos diante de um grupo de jogadores jovens e talentosos o bastante para assumir as rédeas do esporte.
A geração entre essas duas – de Thiem, Dimitrov, Zverev – ainda está em boa forma e deve figurar no circuito por alguns anos. Mas não se assuste se os próximos campeões do mundo vierem dessa lista aqui.