O lado feminino da Fórmula 1

Veja como as mulheres conquistaram o seu espaço no “circo” da Fórmula 1 e o ainda longo e tortuoso caminho até os cockpits das escuderias


Por Cassio Bagnoli

13 de maio de 2024

Parceria Editorial

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O lado feminino da Fórmula 1 (Foto: F1 Academy / Twitter)

Quem acompanha a Fórmula 1, certamente já percebeu que a presença feminina na principal categoria automobilística vem crescendo nos últimos anos. Mais do que nunca, é comum presenciamos mulheres atuando dentro dos paddocks das equipes, auxiliando os pilotos no dia-a-dia, ou até mesmo atuando diretamente nos controles de pista.

Há alguns anos, a categoria vem investindo em temas de diversidade e inclusão, especialmente após a entrada do Media Liberty Group. Ao mesmo tempo, as próprias equipes e montadoras presentes na Fórmula 1, possuem os seus próprios programas de desenvolvimento para as novas gerações de pilotos femininas, e buscam intensificar a presença das mulheres no esporte; como a McLaren, que anunciou a filipina, Bianca Bustamante, como a nova integrante da sua academia de pilotos no ano passado.

Tais medidas intensificaram a participação feminina na Fórmula 1, mas ainda existe um enorme “gap” até o real protagonismo e os pódios das corridas.

Primeiros passos

Tradicionalmente, a categoria sempre foi dominada pelos homens. Porém, a primeira aparição de uma mulher em uma posição de destaque aconteceu há bastante tempo, no longínquo ano de 1958. Enquanto o Brasil conquistava o seu primeiro mundial de futebol; a italiana, Maria Teresa de Filippis, iniciava a caminhada feminina na categoria. Mesmo sem o apoio da família, a piloto italiana continuamente se destacava nos campeonatos automobilísticos da Itália da época, chegando a vencer corridas e terminando na segunda colocação do campeonato italiano de automobilismo de 1954. Foi esse resultado que lhe garantiu um lugar na equipe de pilotos da Maserati, e quatro anos depois a sua estreia na Fórmula 1, na etapa da Bélgica.

Oficialmente, de Filippis, participou apenas de três provas e se aposentou do mundo das corridas um ano após a sua estreia. Na época, correndo pela Porsche, ela decidiu por se retirar após um acidente automobilístico que matou o líder de sua equipe. Mesmo tendo se afastado do esporte, a italiana juntou-se ao grupo de ex-pilotos da Fórmula 1, em 1979, e chegou a ser a vice-presidente do conselho em 1997.

Desde a primeira aparição feminina na categoria, protagonizada pela italiana, apenas outras quatro pilotos conseguiram colocar os pés nos cockpits de carros da Fórmula 1: a inglesa, Divina Galica (1976-1978); a sul-africana, Desiré Wilson (1980); e as também italianas, Lella Lombardi (1974 – 1976) e Giovanna Amati (1992). Entre todas, apenas de Filippis e Lombardi participaram das corridas oficiais, uma vez que antigamente as equipes precisavam classificar os seus carros para poder competir nos grandes prêmios. Lombardi, inclusive, ainda é a piloto de maior sucesso, tendo corrido de forma oficial em 12 etapas, e sendo a única a conquistar pontos.

Fora das pistas da Fórmula 1

Dentro do “circo” da Fórmula 1, o lugar em que as mulheres obtiveram o maior sucesso foram em posições administrativas e técnicas dentro das equipes. Dois nomes de destaque são a neozeolandesa, Angela Cullen, fisioterapeuta particular do piloto da Mercedes, Lewis Hamilton, e que por muito tempo foi uma figura de destaque nos boxes da equipe, por estar constantemente ao lado do piloto britânico. E a engenheira britânica, Hannah Schmitz, que desde a sua formação na universidade de Cambridge, em 2009, iniciou a sua carreira na Red Bull Racing, onde ganhou notoriedade até atingir o atual cargo de chefe de estratégia de corridas, sendo parte importante nos três títulos consecutivos do piloto holandês, Max Verstappen, na Fórmula 1.

Além de Cullen e Schmitz, apenas outras duas figuras femininas conseguiram alcançar altos cargos dentro das escuderias. A indo-austríaca, Monisha Kaltenborn; e a britânica, Claire Williams, ambas assumiram, respectivamente, os cargos de chefes de equipe da Sauber e Williams. Monisha, teve o seu primeiro contato com a categoria ao assumir o departamento jurídico da Sauber, onde evoluiu até adquirir o prestígio que lhe alçou ao cargo de Team Manager. Ela permaneceu cinco anos à frente da equipe, entre os anos de 2012 e 2017, e chegou a ser proprietária de um terço das ações da escuderia.

Por outro lado, Claire, tomou as rédeas da equipe de sua família, em 2013, substituindo o cargo que foi ocupado pelo seu pai, Frank Williams, por 35 anos. Durante o tempo em que geriu a Williams, ela viveu altos e baixos. Com um começo muito bom, Claire, trouxe de volta o prestígio da única equipe de “garagem” da Fórmula 1, com alguns bons resultados que há tempos não se viam. Porém, ao final de 2020, ela anunciou a sua saída da diretoria da escudeira, após duas temporadas péssimas, e o anúncio da venda para o Dorilton Group, um grupo de investimentos norte-americano.

Presente e futuro nas pistas

Desde a última aparição de uma piloto feminina na Fórmula 1, com a italiana Amati em 1992, algumas outras mulheres se aventuraram na tentativa de chegar à principal categoria do automobilismo. Contudo, passaram-se 22 anos até vermos novamente uma mulher no cockpit da Fórmula 1. A responsável pela façanha foi a escocesa Susie Wolff, que participou da primeira sessão de treino do Grande Prêmio da Inglaterra de 2014.

Mais recentemente, as pilotos Jessica Hawkins (Reino Unido) e Tatiana Calderón (Colômbia) ganharam relevância ao assumirem postos de pilotos de testes das equipes Aston Martin e Sauber, respectivamente. Entre elas, Calderón foi pioneira ao ser a primeira mulher a competir na Fórmula 2, a principal categoria de acesso à Fórmula 1.

Mesmo com todo o progresso feito pelas mulheres ao longo do tempo, ainda há um extenso caminho a ser percorrido. Muitas ações têm sido feitas para que algumas atletas de destaque consigam garantir um posto na Fórmula 1. Uma das principais medidas foi a inauguração de uma categoria exclusiva para mulheres, a W Series. O campeonato foi fundado através de uma parceria com empresas, como a Heineken e a Puma, na tentativa de alçar algumas pilotos às principais competições automobilísticas. No entanto, a categoria não durou muito e foi encerrada em 2022 por falta de investimentos.

Logo após o encerramento da W Series, a Federação Internacional de Automobilismo (FIA) tomou a frente de um novo projeto, e lançou a F1 Academy, uma nova categoria também destinada para as mulheres. Diferentemente do projeto proposto pela W Series, na F1 Academy haveria um suporte financeiro da entidade máxima do esporte, garantindo que as provas e o campeonato não sofressem com a falta de patrocínios.

Além disso, as principais pilotos também teriam garantido um cockpit em equipes das categorias de acesso à Fórmula 1. Atualmente, a F1 Academy está na sua segunda temporada, e conta com a participação da brasileira Aurelia Nobels, que faz parte da academia de pilotos da Ferrari, e conta com a colaboração da Puma. A categoria é comanda pela ex-piloto Susie Wolff, a última mulher a pôr os pés num Fórmula 1 durante um grande prêmio, e quem já foi contrária a realização de eventos destinados apenas para mulheres.

Existem diversos questionamentos por parte do público e de alguns integrantes do mundo do automobilismo se estas ações, e a proposta de uma categoria exclusiva para mulheres, irão de fato auxiliar na entrada de pilotos femininas na Fórmula 1. O próprio tricampeão mundial da categoria, Max Verstappen, comentou que os carros utilizados na F1 Academy são muito lentos, e tecnicamente não exigem o mesmo esforço físico de outras categorias como a Fórmula 2 e a Fórmula 3.

Até por isso, a FIA vem tentando novas formas de divulgar a competição e aumentar a visibilidade; há poucos dias foi anunciada a criação de uma série sobre a F1 Academy para a plataforma de streaming Netflix, com a estratégia clara de alavancar a audiência do campeonato, nos mesmo moldes da série Drive to Survive, que teve um papel essencial no incremento de audiência da F1 nas últimas temporadas.