Nos últimos anos, o esporte mundial tem vivenciado uma transformação significativa com a entrada maciça de capital privado em suas estruturas. Ligas e clubes, antes cautelosos com a abertura para esse tipo de investimento, passaram a enxergá-lo como uma oportunidade para se manterem competitivos em um cenário cada vez mais dinâmico. A pandemia de Covid-19 foi um catalisador importante desse movimento, acelerando a busca por novas fontes de receita e capital para mitigar o impacto financeiro das paralisações e incertezas econômicas.
Nos Estados Unidos, as principais ligas esportivas, como NBA, NHL, MLB e, mais recentemente, a NFL, abriram suas portas para investimentos institucionais. No futebol europeu, os números são ainda mais expressivos, com os valores de investimento privado crescendo de € 66,7 milhões em 2018 para impressionantes € 4,9 bilhões em 2022. Grandes clubes, como AC Milan e Chelsea, já foram adquiridos por fundos de private equity, que enxergam no esporte uma oportunidade de retorno financeiro garantido, ancorado em fluxos de receita contínuos e na lealdade dos fãs.
Atração do capital privado
O fascínio do esporte para o capital privado é evidente: transmissões milionárias, grandes audiências e uma resiliência econômica demonstrada ao longo de várias crises tornam esse setor particularmente atrativo. No nível mais alto, o esporte tem mostrado ser à prova de recessões, com as franquias americanas atingindo valores recordes. A NFL, por exemplo, viu a franquia média atingir uma avaliação de US$ 5,7 bilhões em 2023, com o Dallas Cowboys ultrapassando a marca de US$ 10 bilhões.
Além da estabilidade financeira, há um potencial significativo de crescimento nas áreas de mídia digital, tecnologia e infraestrutura esportiva. A tendência de clubes e ligas adotarem estratégias diretas ao consumidor (DTC) e a busca por aprimorar a experiência dos torcedores nos estádios requerem investimentos significativos, o que reforça o interesse de fundos de investimento em buscar oportunidades de retorno a longo prazo.
Impactos e críticas
Entretanto, o influxo de capital privado no esporte também tem gerado críticas e questionamentos sobre seus efeitos a longo prazo. Gerry Cardinale, proprietário do AC Milan e sócio da RedBird Capital Partners, alertou sobre a “inflação massiva” das avaliações de equipes esportivas devido ao capital privado. Segundo ele, o aumento vertiginoso dos valores das franquias é reflexo de uma bolha alimentada por expectativas simplistas de crescimento contínuo.
Cardinale destacou que muitos investidores de private equity, sem a experiência necessária no esporte, buscam apenas oportunidades de liquidez, inflacionando os valores das equipes sem considerar o impacto sobre o ecossistema esportivo. Ele alerta que esse movimento pode gerar um “pouso forçado” quando os valores chegarem a um patamar insustentável, o que pode prejudicar a dinâmica competitiva do esporte, especialmente no futebol europeu.
Exemplos de fracassos recentes, como os casos dos clubes de rugby inglês Wasps, Worcester e London Irish, que entraram em administração mesmo após investimentos consideráveis da CVC Capital, ilustram os riscos de um envolvimento desmedido de capital externo. Além disso, há a resistência de torcedores e clubes a esses acordos, como no caso da La Liga, onde clubes como Real Madrid e Barcelona se opuseram veementemente ao pacto com a CVC.
O futuro dos investimentos
Apesar das críticas, o movimento de entrada do capital privado no esporte parece longe de desacelerar. O Brasil, que recentemente aprovou leis permitindo que os clubes sejam administrados como empresas, também se tornou um mercado promissor para investidores externos, como apontou uma recente análise da Football Benchmark. Há ainda expectativas de que mercados emergentes, como a Saudi Pro League, também se tornem destinos para o capital privado, expandindo ainda mais a presença desses investimentos no esporte global.
Fato é que o capital privado trouxe novos horizontes e desafios para o esporte. Por um lado, oferece liquidez e expertise para melhorar a gestão e as operações comerciais das franquias. Por outro, há um risco real de que o foco excessivo em retorno financeiro possa comprometer a essência competitiva e cultural das equipes e ligas, inflacionando os valores e criando bolhas que podem estourar no futuro.
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