O tênis de mesa brasileiro: a evolução da gestão na CBTM

Após os Jogos Olímpicos no Rio, em 2016, muita coisa mudou nos esportes brasileiros. A Confederação Brasileira de Tênis de Mesa (CBTM) é um bom exemplo para começar a entender essas mudanças.


Por Sport Insider

20 de outubro de 2020

A maioria dos esportes de alto rendimento vive uma dinâmica bastante especial. Os atletas, treinadores e confederações trabalham em ciclos de quatro anos. Um ciclo que determina a rotina de treinamentos, o planejamento de viagens, a alimentação, o calendário de competições e tudo que organiza a vida dos envolvidos. Afinal, a cada quatro anos, os atletas precisam atingir seus picos de performance no maior palco de todos: os Jogos Olímpicos.

Entre 2012 e 2016, o ciclo olímpico trouxe um grande boom brasileiro. Percebeu-se um aumento palpável na qualidade de gestão e qualificação dos profissionais do esporte no país. O motivo? As Olimpíadas Rio 2016, claro.

Um país-sede dos Jogos Olímpicos sempre recebe olhares atentos de toda a população, além de forte torcida pelos competidores nas arquibancadas. Com o aumento considerável de investimento financeiro, as confederações esportivas se esforçam pra atingir o máximo de qualidade possível na gestão da entidade e nos resultados dos atletas, para que consigam aumentar sua presença na sociedade e sua fatia de mercado, comercialmente falando.

Tivemos a oportunidade de acompanhar diversos cases de instituições se encorpando e avançando firme em compliance, planejamentos estratégicos e outras boas práticas difíceis de enxergar no esporte nacional até então. 

Um novo ciclo deveria se encerrar em 2020, mas a pandemia do covid-19 forçou o adiamento dos jogos em Tóquio. Neste ciclo, tivemos a oportunidade de observar os movimentos pós-Rio 2016, que caracterizaram com mais clareza as instituições que de fato seguiram o avanço proporcionado pelos jogos em casa e cada vez mais se consolidaram como modelos de gestão no rumo certo.

Sport Insider pretende trazer, ao longo dos próximos meses, um Raio-X completo desses cases em uma série sobre as confederações esportivas nacionais que já se encontram neste novo patamar. 

Começaremos falando sobre um grande destaque, que é a Confederação Brasileira de Tênis de Mesa, a CBTM.

O time, comandado pelo CEO Geraldo Campestrini, conta com – entre outros profissionais – André Soares na coordenação de Comunicação, João Gabriel Leite na Gerência de Marketing e Nelson Ayres na Assessoria de Imprensa. Conversamos com eles, que passaram uma ótima visão geral das ações realizadas após os jogos de 2016 e como a CBTM está pensando e agindo para se manter neste rumo certo, com um movimento retilíneo uniformemente acelerado.

A entidade foi a grande campeã do Prêmio Sou do Esporte 2019, apontada como a referência em práticas de governança na temporada, depois de ter sido indicada por quatro anos consecutivos entre as cinco melhores confederações neste quesito. Atualmente, figura entre as melhores do país em todos os indicadores existentes no esporte. 

No Rating Integra, ficou entre as cinco melhores do país. Acreditam que este conceito de avaliação deve subir em 2020, já que os últimos resultados retratam apenas a temporada 2018. No Programa Gestão, Ética e Transparência (GET), do Comitê Olímpico do Brasil (COB), ficou em primeiro entre todas as confederações participantes. 

Em março de 2020, ocorreu o lançamento da nova campanha institucional: “Prazer, Ping-Pong. A atividade famosa de lazer passou a ser vista com carinho pelo tênis de mesa, que quer conectar cada vez mais fãs para a modalidade olímpica. 

O termo ping-pong deixou de ser considerado pejorativo e vai fazer com que todos possam associá-lo ao tênis de mesa de forma afetiva. O objetivo é acessar o imaginário das pessoas, já que o esporte está mais inserido em áreas de lazer do que em áreas de performance, além de retomar as boas lembranças que todas as pessoas têm com a modalidade. 

O tênis de mesa é um dos esportes mais praticados no mundo e não é diferente no Brasil. As mesas estão presentes em quase todos os condomínios, escolas e clubes. Quem nunca se arriscou numa brincadeira em casa, na escola ou até mesmo no trabalho? O esporte é uma potência em alguns países do mundo, como a China, onde há milhões de praticantes em uma febre nacional. Acreditando neste potencial, a CBTM vem atuando de forma intensa para mostrar essa paixão ao mercado, com resultados planejados para médio prazo. O objetivo é saltar dos atuais 4 mil praticantes no sistema federativo, para cerca de 50 mil dentro do próximo ciclo olímpico.

Foto: divulgação / CBTM

No campo esportivo, o tênis de mesa do Brasil tem seis atletas no Top 100 mundial: Bruna Takahashi, Eric Jouti, Gustavo Tsuboi, Hugo Calderano, Thiago Monteiro e Vitor Ishiy. Calderano se destaca, presente no Top 10 mundial há 21 meses. A equipe masculina está entre as oito melhores do mundo. Na base, Giulia Takahashi é a terceira melhor do mundo do ranking sub-15. 

Isso já poderia ser suficiente para fazer com que o tênis de mesa pudesse ter um aumento de praticantes e agradar aos fãs, mas faltava algo. Ser cada vez mais uma entidade que valoriza seus filiados e presta serviços relevantes, agregando valor e confiabilidade, aumentando a participação de todos e se tornando mais atraente aos olhos do mercado. E, neste ano, algumas ações dentro do esporte, convergiram para este caminho. 

Uma das primeiras mudanças foi no sistema nacional de competições, que passou a ter três pilares: integração, com torneios de todos os níveis passando a fazer parte do sistema, permitindo que um praticante de lazer em uma Liga Regional pertença ao sistema nacional; anuidades, com a Taxa de Registro respeitando o nível de cada praticante; e um sistema Web que compreende todas as etapas de registro, gerenciamento de filiados, gerenciamento de competições, operacionalização das competições, dentre outros. 

As competições estão organizadas em um calendário que prevê a realização de uma grande competição nacional a cada trimestre. Há as competições TMB Platinum (nacionais), TMB Challenge e Challenge Plus (competições nacionais organizadas pelas Federações Estaduais e chanceladas pela CBTM), TMB Estadual (Etapas do Campeonato Estadual, organizadas pelas Federações Estaduais) e TMB Regional (Etapas das Ligas Regionais Oficiais). 

Na sequência, a CBTM lançou o primeiro programa de fidelidade do esporte olímpico brasileiro, gerando prêmios para os filiados dentro e fora do ambiente de competições. O “Ping Pontos TMB” é exclusivo para os filiados da CBTM e os pontos podem ser trocados em uma rede integrada de parceiros. Acredita-se que este programa também ajudará fortemente a caminharem rumo aos 50 mil praticantes oficiais de tênis de mesa em nosso país. Inclusive, os negócios da própria comunidade podem ingressar na rede de parceiros, caso o membro seja um empreendedor (loja especializada, restaurantes ou seguros, por exemplo). Os pontos conquistados podem ser trocados por experiências exclusivas, produtos da Seleção, taxas de cursos, registros ou por prêmios na própria rede de parceiros.

Foto: divulgação / CBTM

Outra iniciativa lançada para integrar a comunidade, foi o “Coletivo Ping-Pong”. A campanha vem na esteira de ações mundiais, como a da Federação Internacional de Tênis de Mesa (ITTF), que criou a ITTF Foundation. O objetivo é promover ações que possam gerar inclusão social e interação entre grupos que não são tão numerosos na modalidade, construindo uma sociedade coletivista, inclusiva e empática por meio do tênis de mesa. Aumentar a presença das mulheres, repúdio a qualquer tipo de discriminação e promoção do esporte para a saúde e sustentabilidade são temas frequentemente abordados. 

Algumas ações foram oferecidas inicialmente pelo Coletivo. A primeira delas é uma plataforma de financiamento coletivo, que visa ajudar os projetos de tênis de mesa cadastrados no site oficial da CBTM. Quem apoia é recompensado no Ping-Pontos TMB. Além disso, houve um investimento no canal da CBTM no YouTube, que agora conta com diferentes programas e uma produção de alto nível. 

Some-se a tudo isso uma mudança de parâmetros técnicos em suas próprias competições. Em 2019, esse cuidado maior gerou um Campeonato Brasileiro com o maior número de inscritos em toda a história: mais de mil atletas, com arquibancadas cheias no Centro Paralímpico Brasileiro. Na Comunicação, a entidade busca se aproximar cada vez mais dos fãs e ídolos. Produtos como o Resenha TMB, o Ping Pong com os Ídolos, o TMB News, entre alguns outros, movimentaram o canal do YouTube, reunindo grandes nomes do tênis de mesa em plena pandemia. 

Por fim, a Universidade do Tênis de Mesa busca oferecer capacitação para profissionais que queiram trabalhar com o esporte, como técnicos, árbitros e gestores, além do projeto Diamantes do Futuro e Detecção Nacional de Talentos, que geraram craques como o próprio Hugo Calderano. 

Se os planos da CBTM para 2020 foram adiados momentaneamente, o alicerce bem construído permitiu que a confederação continuasse planejando um futuro ousado. Não será uma surpresa se o tênis de mesa se tornar uma febre no Brasil. 

Entrevistamos Geraldo Campestrini, CEO da CBTM, que respondeu alguns questionamentos em relação ao pré e pós ciclo Rio 2016:

– Como funcionava a federação antes do Rio 2016? 

A Confederação Brasileira de Tênis de Mesa foi fundada em 1979, portanto, completou 40 anos recentemente. Conta com quase 30 colaboradores e segue um planejamento estratégico há muitos anos. Sempre foi uma entidade que primou pela ousadia, buscando ser sempre pioneira em ações de promoção do esporte, realizando dezenas de eventos internacionais em nosso país. 

– Como foi a transição para a preparação dos jogos olímpicos em casa? 

Em 2009, a CBTM iniciou o projeto da Rota do Alto Nível. Implantado pelo consultor francês Michel Gadal, técnico responsável pela preparação do medalhista olímpico e o campeão mundial Jean Phillipe Gatien. O objetivo era preparar o tênis de mesa brasileiro para um salto de qualidade. O técnico francês Jean-René Mounie foi contratado para liderar o processo de capacitação dos treinadores brasileiros e foram implantados programas como a Detecção Nacional de Talentos e o Diamantes do Futuro. Houve um investimento importante no intercâmbio, com atletas sendo enviados para o exterior, para treinarem em clubes europeus e houve o envio de atletas para eventos do Circuito Mundial. O exemplo mais bem-sucedido foi o do atleta Hugo Calderano, trabalhado pela CBTM desde 2012, que conquistou a melhor posição de um brasileiro nos Jogos Olímpicos (oitavas de final, em 2016), a melhor posição de um brasileiro no Mundial (oitavas de final, em 2019) e atualmente é o sexto melhor do mundo. O Brasil, que raramente tinha um Top 100 no ranking mundial, atualmente tem seis atletas neste patamar nos rankings masculino e feminino. 

– Já se pensava no pós-olímpico, como legado, antes da realização dos jogos? Se sim, qual era o plano/estratégia? 

Sim. A contratação de consultoria internacional teve como foco a oportunidade de alavancar a melhoria da performance do país em âmbito internacional de forma estruturada e perene. A visão de longo prazo se iniciou anos antes dos Jogos Rio 2016. 

– Como foi o cenário para a federação, durante os jogos? 

Muito positivo, com crescimento do esporte e o melhor resultado da história, igualando a participação de Hugo Hoyama, em 1996. 

– A atuação (resultados), nos jogos, impactou positivamente? Teve adesão do público? 

Sim, atualmente a CBTM tem número crescente de seguidores em todas as mídias e boa participação de praticantes nas competições, não só pelos Jogos, mas principalmente pelo trabalho desenvolvido pela CBTM, em conjunto com Federações Estaduais, Ligas Regionais e Clubes, e o crescente número de ídolos no esporte. 

– Logo ao fim dos jogos, como foi o processo de fechamento do ciclo para federação e atletas? 

O processo teve continuidade até os dias atuais, em que pese a redução de 40% nas receitas de um ano para outro. Como esta realidade já era esperada e estava planejada, conseguimos superar as dificuldades iniciais e construir resultados ainda melhores. 

– O que ficou de legado? 

Todo o material utilizado nos Jogos Olímpicos e Paralímpicos Rio 2016 ficaram como legado estrutural. Vários estados receberam este material, servindo para equipar centros de treinamento em várias regiões do Brasil, além de serem utilizados em eventos nacionais organizados pela CBTM. Além disso, consideramos o legado humano, uma vez que alguns de nossos colaboradores atuaram na organização dos Jogos Rio 2016 e hoje entregam este know-how em eventos nacionais e suporte administrativo interno.  

– O que se esperava e o que de fato aconteceu? 

Conforme foi explicado anteriormente, houve uma redução significativa no repasse de recursos da Lei Agnelo Piva. Porém, os resultados foram na contramão desta redução, com um crescimento cada vez maior da participação dos nossos atletas na elite do tênis de mesa mundial e resultados inéditos, como a quinta colocação na Copa do Mundo de Equipes de 2018 e o mesmo resultado no Mundial por Equipes de 2018. 

– Sobre investimentos, torcida e atletas inscritos, houve evoluções? 

Sim. Nossa base de atletas registrados tem evoluído significativamente. Este é um dos principais pilares do plano estratégico: a qualidade contínua dos nossos serviços para aumentar a base de membros filiados. Com relação a investimentos, nosso plano está estruturado para buscar novos recursos privados e, assim, ampliar o desenvolvimento do tênis de mesa brasileiro. 

– Quais os próximos passos? 

Até 2024, queremos ser uma entidade admirada pela comunidade do tênis de mesa, construindo senso de pertencimento e excelência na prestação de serviços em prol de atletas, praticantes e fãs. Ambicionamos chegar a 50 mil filiados, aumentando a participação da modalidade no mercado consumidor e ampliando a possibilidade de gerar novos talentos para o esporte.